serievegetacao serievegetacao2

SÉRIES DE VEGETAÇÃO DA ILHA DA MADEIRA

A vegetação na Madeira enquadra-se, em geral, em três tipos: uma vegetação florestal e pré-florestal climácica, às suas etapas de substituição e naturalmente a vegetação associada à presença humana.

Estes tipos diferentes de vegetação apresentam uma representatividade influenciada pelo uso antrópico intenso que se faz sentir, desde a colonização da ilha da Madeira no século XV. Este uso intensivo fez-se sentir essencialmente nas altitudes mais baixas da encosta norte, e em quase todo o gradiente altitudinal da encosta sul da ilha da Madeira.

É nas altitudes mais elevadas da Madeira, essencialmente nas encostas norte, que persiste uma das maiores extensões de floresta Laurissilva (Clethro-Ocoteetum foetentis). Embora a utilização agrícola dos terrenos a cotas mais baixas seja feita de uma forma intensiva, em especial na encosta sul, este uso agrícola é feito de forma descontínua propiciando a ocorrência de mosaicos de vegetação natural, os quais nos indicam o tipo de vegetação potencial existente nessas mesmas áreas.

Tendo por base a classificação bioclimática da terra, a sua modelação espacial, a tipologia de solos de Madeira, e a tipologia fitossociológica da vegetação não-sinantrópica ou seja vegetação que não é resultante de atividades agrícolas ou cultivada, foi construído um modelo aproximativo das séries de vegetação da Ilha da Madeira.

As séries de vegetação ou complexos de vegetação agrupam-se em dois grupos: climatófila, em que o clima determina o tipo de vegetação existente; edafófila, em que o substrato determina o tipo de vegetação existente. Cada série apresenta diferentes etapas de substituição até ser atingida a etapa climácica, esta última corresponde ao coberto vegetal ótimo para um determinado tipo de bioclima ou tipo de solo.

Desde o nível do mar e progredindo em altitude, as séries de vegetação são as seguintes (Capelo et al. 2004)*:

1. Complexos de vegetação climatófila
serieChamaemelesc serieDracenadraco serieEchiumnerv 

1.1. Série do zambujal madeirense [Mayteno umbellatae-Oleo maderensis sigmetum]

Esta série é exclusiva das cotas mais baixas e escarpas rochosas da encosta Sul, entre os 0 e 200 metros de altitude.
O clímax (Mayteno umbellatae-Oleetum maderensis) corresponde a micro-bosques ou matagais infra-florestais dominados por arbustos perfeitamente adaptados a condições de falta de água e de temperaturas mais elevadas como sejam a Olea maderensis (oliveira-brava), Maytenus umbellata (buxo-da-rocha), Chamaemeles coriácea (buxo-da-rocha), Dracaena draco (dragoeiro) e o Asparagus scoparius (esparto). Este clímax corresponde à floresta de oliveira-brava da Madeira.

O mato de substituição é maioritariamente, em solos medianamente profundos menos erodidos e solos agrícolas abandonados, a comunidade de figueira-do-inferno (Euphorbietum piscatoriae), na qual dominam a Euphorbia piscatoria (figueira-do-inferno) a Globularia salicina (malfurada) e o Echium nervosum (massaroco).
 
serieEuphorbiapisc serieOleamad serieOleamad2

Em solos incipientes e afloramentos rochosos tende a ocorrer maioritariamente a Artemisio argenteae-Genistetum tenerae, em que são dominantes táxones como: Genista tenera, Carlina salicifolia, Micromeria varia subsp. thymoides e Phagnalon lowei.

A etapa herbácea vivaz corresponde a um arrelvado de gramíneas andropogóneas profundamente enraizadas (Cenchro ciliaris-Hyparrhenietum sinaicae). Os arrelvados anuais correspondentes são sub-nitrófilos e dominados por Brachypodium distachyum (Galactito tomentosae-Brachypodietum distachyae). As comunidades rupícolas em mosaico com a vegetação serial pertencem principalmente ao Sedo nudi-Aeonietum glutinosi. O uso do território corresponde a culturas hortícolas em socalcos, bananais e também à maior área de expansão.
 
1.2. Série do matagal de marmulano [Helichryso melaleuci-Sideroxylo marmulanae sigmetum]
Série presente sobre solos pouco profundos exposta aos ventos carregados de humidade na encosta norte. Ocorre aproximadamente entre os 200 e 300 metros de altitude na encosta sul e os 0 e 50 (até aos 80) ao longo da encosta norte.

O clímax é um micro-bosque arborescente dominado pelo Sideroxylon mirmulans (marmulano), Maytenus umbellata (buxo-da-rocha), Globularia salicina (malfurada) e por o Juniperus turbinata subsp. canariensis (zimbreiro) - (Helichryso melaleuci-Sideroxyletum marmulanae).
A etapa de substituição mais frequente é o Euphorbietum piscatoriae.

Na encosta norte é frequente, como etapa de substituição, uma comunidade de Helichrysum melaleucum e Globularia salicina.
Nos biótopos mais escarpados, ocorre em contacto catenal com o micro-bosque de marmulano, uma comunidade de Aeonium glandulosum (ensaião) - (Sinapidendron gymnocalicis-Sedetum brissemoretii).
 
serie2Apolonias serie2Genaria serie2Hypericum

1.3. Série da laurisilva mediterrânica do barbusano [Semele androgynae-Apollonietum barbujanae sigmetum].

Série florestal sobre solos pouco profundos de ambas as encostas. O clímax é a laurissilva do barbusano, uma floresta dominada pelo Apollonias barbujana (barbusano), - Laurus novocanariensis (loureiro), Morella faya (faia-das-ilhas) e Ilex canariensis (azevinho), de características termófilas e claramente mediterrânicas (Semele androgynae-Apollonietum barbujanae). São abundantes no sub-bosque, as lianas como sejam o Semele androgyna (alegra-campo), Smilax pendulina, Smilax canariensis, Hedera maderensis subsp. maderensis, Convolvulus massonii e Rubia agostinhoi. Outras plantas termófilas como o Asparagus umbellatus subsp. lowei (esparto), Visnea mocanera (mocano) e Maytenus umbellata (buxo-da-rocha), tendem a ser características também deste bosque.

serie2Convolvulus serie2Semele serie2Smilax

Esta série possui duas faciações que se distinguem pelas distintas etapas de substituição de matagal:
– Assim, a faciação que se desenvolve apenas nas cotas mais baixas da encosta sul, entre os 300 e os 600 m.s.m, tem como orla de matagal de Hypericum canariensis (hipericão) - (Myrto communis-Hypericetum canariensis).

– A faciação que na encosta sul ocorre entre os 600 - 800 m.sm.; e na encosta norte ocorre entre os 50 – 300 (450) m.s.m é substituída pelo urzal / faial de Erica platycodon subsp. maderincola, E. arborea e Morella faya, rico em elementos como a Globularia salicina (malfurada), o Echium nervosum (massaroco), Helichrysum melaleucum, Teucrium betonicum, etc - (Globulario salicinae-Ericetum arboreae).
No âmbito desta série, as fases mais degradadas do coberto vegetal apresentam dominância do Euphorbietum piscatoriae.

serie3DactylorhizaV serie3IsoplexisV serie3m30046V

1.4. Série da laurisilva temperada do til [Clethro arboreae-Ocoteo foetentis sigmetum].

Serie florestal ocorrendo em solos mais profundos. Esta série ocupa a maior extensão da área de ambas encostas [800 – 1450 m.sm. na encosta S; 300 – 1400 m.sm. na encosta norte].
O clímax é a vulgarmente denominada floresta de laurissilva do til, uma floresta que atinge, por vezes, cerca de 30 m de altura e é dominada pelas espécies Ocotea foetens (til),  Laurus novocanariensis (loureiro) e a Clethra arborea (folhado) e onde são também frequentes as espécies Picconia excelsa (pau-branco), Heberdenia excelsa (aderno), Persea indica (vinhático), Prunus hixa (gingeira-brava) e o Ilex perado subsp. perado (azevinho) - (Clethro arboreae-Ocoteetum foetentis).

O sub-bosque da floresta de til tem uma diversidade muito grande e é constituido por:
Pteridófitos como Diplazium caudatum, Pteris incompleta, Asplenium onopteris, Dryopteris maderensis, Woodwardia radicans, Dryopteris aitoniana, Arachniodes webbiana, Blechnum spicant subsp spicant, Culcita macrocarpa;
Gramíneas e ciperáceas como Festuca donax, Carex lowei, Carex peregrina; Lianas, como Rubus bollei e Rosa mandonii;

Outros elementos frequentes incluem Ruscus streptophyllus, Rubia agostinhoi, Viola odorata, Phyllis nobla, Hypericum grandifolium e Sibthtorpia peregrina.

serie3Argyranthemum serie3m300 serie3Pittosporum
 

As orlas e clareiras naturais do bosque são ocupadas por comunidades de ervas vivazes que ocorrem em ambientes sombriados ou de luz difusa (Trifolio-Geranietea sanguinei) dominadas por Geranium palmatum, Pericallis aurita, Ranunculus cortusifolius subsp. major, Brachypodium sylvaticum, Origanum vulgare subsp. virens, Cirsium latifolium, Dactylorhyza foliosa, Orchis scopulorum, etc. (Pericallido auritae-Geranietum palmatae).

Para além das comunidades acima referidas, existem outras mais que ocorrem nos numerosos micro-habitats incorporados na floresta laurissilva do til, de onde se destacam:
–Comunidades epifíticas, as quais ocorrem sobre os troncos de árvores (Davallio canariensis-Polypodietum macaronesici); comunidades de barreiras terrosas sombrias (Sellaginello denticulatae-Cystopteridetum viridulae, Hymenophylletum thumbrigensi-maderensis);
–Comunidades de Aeonium glandulosum (ensaião) - (Aichrysetum divaricato-villosi);
–Comunidades de plantas que ocorrem nas “quebradas” e linhas de água de leito pedregoso dominadas por Isoplexis sceptrum, Euphorbia mellifera, Musschia wollastonii, Melanoselinum decipiens e Sonchus fruticosus (Isoplexido sceptri-Euphorbietum melliferae).

Nas linhas de água, em contacto catenal com o Clethro-Ocoteetum foetentis, ocorrem as comunidades ripícolas do Diplazio caudati-Perseetum indicae, nos troços médios das ribeiras ou Rhamno glandulosi-Sambucetum lanceolati nas cabeceiras pedregosas.

Nesta série de vegetação, quando se dá a degradação de áreas da comunidade climácica vulgarmente denominada floresta de laurissilva do til (Clethro arboreae-Ocoteetum foetentis), ocorrem diferentes etapas de substituição que conduzem ao estado climácico:

serie3Ranunculus serie3Sonchus serie3m30044

– A orla e primeira etapa de substituição da floresta de til é um urzal semi-arborescente (Vaccinio padifoli-Ericetum maderincolae), em que são dominantes a Erica platycodon subsp. maderincola (urze-das-vassouras), a Erica arborea (urze-molar), e o Vaccinium padifolium (uveira). Em falésias e alcantilados rochosos, este urzal pode assumir o carácter de comunidade permanente. Tratam-se geralmente de urzais em solos delgados com baixa capacidade de retenção de água, mas sujeitos a precipitação oculta intensa.
– Uma segunda orla de matagal surge normalmente como segunda etapa de substituição, dominado por Genista tenera e Teline maderensis (Bystropogono puncatati-Telinetum maderensis). A destruição destas comunidades lenhosas origina um arrelvado anual: Leontodo longirostris-Ornithopetum perpusili.
 

serie4Berberis serie4Sorbus serie4Vaccinium

1.5. Série do urzal de altitude [Polysticho falcinelli-Erico arboreae sigmetum].
Série hiper-húmida superior e ultra-hiper-húmida, em solos pouco espessos, com dominância de Erica arborea (urze-molar) - e .E. platycodon subsp maderincola (urze-das-vassouras). O clímax é um bosque de urzal arbóreo, que ocupa aproximadamente as cotas acima de 1400 m.s.m, mas acima de 1650 m.s.m, a comunidade rareia, pois tratam-se maioritariamente de afloramentos rochosos e já no andar supramediterrânico ultra-hiper-húmido. Tratam-se de micro-bosques abertos, com sub-bosque esparso, constituído essencialmente pelo feto Polystichum falcinellum. Nas clareiras dos urzais arbóreos ocorrem as comunidades herbáceas vivazes de Teucrium francoi (Teucrio francoi-Origanetum virentis), as quais são características de zonas de pouca luz ou luz difusa.

Na orla arbustiva desta floresta ocorrem dois tipos de comunidades:
– Numa primeira orla temos uma comunidade quase mono-específica de E. platycodon subsp. maderincola.
– Numa segunda orla arbustiva, temos um urzal constituído por espécies de pequeno porte dominado por Erica maderensis, mas com outros elementos arbustivos, tais como Teline maderensis, Argyranthemum pinnatifidum subsp. montanum, Genista tenera, Cytisus scoparius subsp. scoparius, Echium candicans, Thymus micans.
 
serie5Armeria serie5Anthyllis serie5Saxifraga 

1.6. Vegetação rupícola de altitude. [Amerio maderensis-Parafestuco albidae microgeosigmetum].
Comunidades rupícolas permanentes da porcão cacuminal rochosa da Madeira acima de 1650 m.s.m., sendo essencialmente constituída por um mosaico de três comunidades:
Armerio maderensis-Parafestucetum albidae, com a presença de espécies dominantes tais como as espécies Anthyllis lemanniana e Armeria maderensis, e as gramíneas Deschampsia maderensis, Koeleria loweana, e Anthoxanthum maderense;
Sinapidendro frutescentis-Aeonietum glandulosi, em que temos como espécies dominantes o Aeonium glandulosum (ensaião), Sedum farinosum, Sinapidendron frutescens, Tolpis macrorhiza e Saxifraga  pickeringii;
Thymetum micantis, em que a espécie dominante é Thymus micans.

2. Complexos de vegetação edafófila
2.1. Laurisilva ripícola do sabugueiro madeirense [Rhamno glandulosi-Sambucetum lanceolati].
Comunidade característica das cabeceiras pedregosas das ribeiras, em que dominam as espécies Sambucus lanceolata e Rhamnus glandulosa.
 
serie5Erica serieChamaemelesc serie5SinapidendronV

2.2. Laurisilva ripícola do vinhático [Diplazio caudati-Perseetum indicae].
Comunidade característica dos troços médios das ribeiras em solos, com depósitos de materiais aluvionares. São dominantes as espécies Persea indica e Laurus novocanariensis. O sub-bosque é dominado pelos pteridófitos Diplazium caudatum e Woodwardia radicans.
 
serie5OrchisV serie5DeschampsiaV serie5EchiumV

2.3 Seixal [Scrophulario hirtae-Salicetum canariensis].
Comunidade característica dos troços finais das ribeiras, colonizadora de zonas de “quebradas” torrenciais e por vezes substituindo bosques de Persea indica (vinhático). Nesta comunidade é característica a presença da espécie Salix canariensis.

Bibliografia:
*Capelo, J., Menezes de Sequeira, M., Jardim, R. & Costa, J. C. (2004). Guia da excursão geobotânica dos V Encontros ALFA 2004 a ilha da Madeira. in Capelo, J. A paisagem vegetal da ilha da Madeira. pp. 5 -45. Quercetea, 6, 3 -200

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